Morre Gene Hackman; vencedor do Oscar e esposa foram encontrados mortos em casa
Publicado em 27/02/25 07:00
O mundo do cinema perdeu um de seus maiores atores na madrugada desta quinta-feira (27). Gene Hackman, a duas vezes vencedor do Oscar (por Operação França e Os Imperdoáveis) faleceu aos 95 anos de idade. Hackman e sua esposa Betsy Arakawa foram encontrados mortos em sua casa em Santa Fe, nos EUA.
De acordo com a polícia de Santa Fe, não há suspeita de crime. Relatos locais (via Variety) dizem que o cachorro de Hackman e Arakawa, uma pianista de 63 anos, também foi encontrado morto. Uma causa de morte não foi determinada ainda.
"Tudo que posso dizer é que estamos no meio de uma investigação preliminar da morte, esperando um mandato de busca," disse o xerife do condado de Santa Fe, Adan Mendoza, ao Santa Fe New Mexican. "Eu quero garantir à comunidade e à vizinhança que não há nenhum perigo imediato para mais ninguém."
Hackman havia se aposentado do cinema há mais de 20 anos e se afastado da esfera pública. Arakawa e ele eram casados desde 1991.
Gene Hackman foi uma das presenças mais singulares do cinema durante o século 20. Ele começou a atuar na telona em 1961 em O Terror de Uma Cidade, onde teve um papel pequeno e nã ocreditado. O início de sua carreira também incluiu passagens pela TV com seriados como The United States Steel Hour, onde Hackman interpretou mais de um personagem, e Os Defensores.
Gene Hackman em Operação França.
O primeiro de sues muitos papéis inesquecíveis veio em 1966 ao lado da dupla Warren Beatty e Faye Dunaway no clássico Bonnie e Clyde: Uma Rajada de Balas, onde sua atuação como Buck Barrow lhe rendeu uma indicação ao Oscar de 1967 na categoria de Melhor Ator Coadjuvante, a primeira de cinco nomeações de Hackman ao prêmio. Ele voltou a ser indicado em 1971 por Meu Pai, um Estranho, na mesma categoria.
O grande feito de Hackman em 1971, porém, foi interpretar o policial de caráter questional Jimmy "Popeye" Doyle no clássico de William Friendkin, e um dos maiores marcos da Nova Hollywood, Operação França. Como o detetive racista, esquentado e dedicado, Hackman caçou o contrabandista de drogas Alain Charnier (Fernando Rey) ao lado de seu parceiro vivido por Roy Schreider, incluindo numa das mais emblemáticas perseguições de carro da história do cinema. O papel lhe deu seu primeiro Oscar no ano seguinte, na categoria de Melhor Ator.
Gene Hackman em A Conversação.
Como muitos atores de sua época, Hackman teve seu auge nos anos 1970. Além de Operação França II, ele atuou em diversos clássicos. Talvez o maior deles seja A Conversação de Francis Ford Coppola, onde seu trabalho como o técnico de áudio Harry Caul, um homem especlializado em gravar conversas secretamente para pegar pessoas no flagra, foi na contramão da explosividade e gritaria que muitos associam à sua presença. Tímido e introspectivo, Caul eventualmente vê o mundo da vigilancia virar contra ele mesmo, e conforme A Conversação entra no território do suspense paranóico, Hackman protagoniza uma história profundamente moderna e atual sobre o fim da privacidade.
No fim da década, Hackman faz o primeiro de alguns vilões marcantes do cinema. Ele é o Lex Luthor de Superman (1978), estampando o cartaz do filme ao lado do Jor-el de Marlon Brando e do Clark Kent de Christopher Reeve. Sua versão de Luthor é cômica, exagerada, usa peruca e tem planos dignos de desenhos animados, mas o sarcasmo e ironia transbordando da boca do vilão oferecem o contragosto perfeito para a retidão honesta do Superman de Reeve. Superman foi o primeiro grande filme de herói da história, abrindo o caminho para a eventual popularização do gênero décadas depois, e se provou um sucesso comercial e de críticas. Hackman voltou a interpretar Lex Luthor na continuação Superman II: A Aventura Continua (1981), também dirigida por Richard Donner, e retornou ao papel no esquecido e rejeitado Superman IV: Em Busca da Paz, de 1987.
Gene Hackman como Lex Luthor ao lado de Christopher Reeve como Superman.
Dois anos depois de deixar Lex Luthor para trás, Hackman voltou a ser indicado ao Oscar por interpretar um policial, Rupert Anderson, em Mississippi em Chamas. Protagonizando o filme de Alan Parker, ao lado de Willem Dafoe, ele vive um agente do FBI que, apesar de ser mais novo e ter uma patente menor que seu colega, demonstra mais experiência e esperteza na investigação da morte de três pessoas, dois judeus e um preto, que eventualmente os coloca em rota de colisão com a seita racista Ku Klux Klan.
Hackman não ganhou o prêmio pelo filme, lançado em 1988, mas logo voltaria ao palco da Academia por outro papel inesquecível. O ator foi premiado com o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante pelo clássico Os Imperdoáveis, de Clint Eastwood. O filme venceu quatro Oscars no prêmio de 1993 (incluindo Melhor Ator e Diretor para Eastwood, e Melhor Filme), e representa um marco na história do faroeste. Reflexivo, o longa-metragem coloca Eastwood como um pistoleiro que volta à ação e é assombrado pela violência do passado. Quem o faz pegar em armas novamente é o xerife "Little Bill" Daggett, vivido por Hackman em mais uma de suas atuações como homens detestáveis.
Gene Hackman em Os Imperdoáveis.
É fácil cair no erro de enxergar a carreira de Hackman como uma de papéis assim, mas a verdade é que ele era um dos intérpretes mais versáteis de Hollywood, se mostrando capaz para a comédia (veja: O Nome do Jogo), drama (Maré Vermelha), suspense (A Firma) e tudo no meio. Durante os anos 1980, ele foi o técnico de um pequeno time de basquete no adorado Momentos Decisivos, e seu último grande papel veio já no Século 21, com Os Excêntricos Tenenbaums de Wes Anderson.
Como Eastwood em Os Imperdoáveis, Hackman parece refletir sobre sua vida e carreira como Royal Tenenbaum, o patriarca de uma família rica mas totalmente fragmentada que diz estar morrendo para convencer os filhos e a ex-mulher a se reunirem uma última vez. O filme elevou o diretor Wes Anderson a outro patamar, e ofereceu a Hackman uma chance de mostrar, mais uma vez, seus talentos como ator. Os Excêntricos Tenenbaums não é seu último trabalho, mas funciona como uma despedida poética. Após interpretar tantos personagens de caráter questionável, Hackman, no fim da carreira, decide viver alguém que lida com o peso de erros passados.
Gene Hackman em Os Excêntricos Tenenbaums.
Gene Hackman foi casado com Faye Maltese entre 1956 e 1986. O casal teve três filhos: Chirstopher, Elizabeth e Leslie. No seu segundo casamento, com Arakawa, o ator não teve mais filhos.
Fonte: Omelete // Guilherme Jacobs